O dono do livro [Martha Medeiros]

Possuo muitos livros. Adoro ler, (quase) um vício! E vem de família. 

Assim como amo ler, me dá satisfação de encontrar pessoas que compartilham do mesmo hobby, de conhecer lugares que talvez nunca conhecerão, culturas diferentes, emoções diversas.

Muito interessante essa crônica da Martha que fala sobre a propriedade de um livro e a curiosa história de um garoto africano que roubou um livro para devolver ao seu "dono".

Ler é uma forma de expandir os horizontes, de não ficar isolado na ignorância. O livro nos permite conhecer lugares que talvez nunca vamos conhecer, pessoas e culturas diferentes, emoções diversas.

Há anos busco fazer a minha parte e ajudar outras pessoas a viajar pelo mundo da literatura. Um dos projetos que acredito e colaboro é o Doe um Livro no Natal, que começou como uma iniciativa informal pelo Twitter para incentivar os internautas a doarem livros no Natal. Deu tão certo que o projeto foi "abraçado" pela rede de farmácias Droga Raia que disponibiliza suas lojas para a coleta dos livros para distribuir em comunidades carentes e bibliotecas públicas e de escolas. O foco da campanha é arrecadar livros de literatura (livros didáticos estão fora do projeto).

Faça sua parte, ajude a formar novos leitores: pegue uns livros antigos, aqueles que já estão cheios de poeira e passe em uma Droga Raia. Todo mundo precisa ir à farmácia, não é nenhum grande esforço e você está colaborando para a educação e desenvolvimento de muitas pessoas. :)

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Escutei outro dia um fato engraçado contado pelo escritor moçambicano Mia Couto. Ele disse que certa vez chegou em casa no fim do dia, já havia anoitecido, quando um garoto humilde de 16 anos o esperava sentado no muro. O garoto estava com um dos braços para trás, o que perturbou o escritor, que imaginou que pudesse ser assaltado. Mas logo o menino mostrou o que tinha em mãos: um livro do próprio Mia Couto. “Este livro é seu?”, perguntou o menino. “Sim”, respondeu o escritor. “Vim devolver”. O garoto explicou que horas antes estava na rua quando viu uma moça com aquele livro nas mãos, cuja capa trazia a foto do autor. O garoto reconheceu Mia Couto pelas fotos que já havia visto em jornais. Então perguntou para a moça: “Este livro é do Mia Couto?” Ela respondeu: “É”. E o garoto mais que ligeiro tirou o livro das mãos dela e correu para a casa do escritor para fazer a boa ação de devolver a obra ao verdadeiro dono.
Uma história assim pode acontecer em qualquer país habitado por pessoas que ainda não estejam familiarizadas com os livros - aqui no Brasil, inclusive. De quem é o livro? A resposta não é a mesma de quando se pergunta quem escreveu o livro. O autor é quem escreve, mas o livro é de quem lê, e isso de uma forma muito mais abrangente do que o conceito de propriedade privada, “comprei, é meu”. O livro é de quem lê mesmo quando foi retirado de uma biblioteca, mesmo que seja emprestado, mesmo que tenha sido encontrado num banco de praça. O livro é de quem tem acesso às suas páginas e através delas consegue imaginar os personagens, os cenários, a voz e o jeito com que se movimentam. São do leitor as sensações provocadas, a tristeza, a euforia, o medo, o espanto, tudo o que é transmitido pelo autor, mas que reflete em quem lê de uma, forma muito pessoal. É do leitor o prazer. É do leitor a identificação. É do leitor o aprendizado. É do leitor o livro.
Dias atrás, gravei um depoimento para o rádio em que falo aos leitores exatamente isso: os meus livros são os seus livros. E são, de fato. Não existe livro sem leitor. Não existe. É um objeto fantasma que não serve pra nada.
Aquele garoto de Moçambique não vê assim. Para ele, o livro é de quem traz o nome estampado na capa, como se isso sinalizasse o direito de posse. Não tem ideia de como se dá o processo todo, possivelmente nunca entrou numa livraria, nem sabe o que significa tiragem. Mas, em seu desengano, teve a gentileza de tentar colocar as coisas em seu devido lugar, mesmo que para isso tenha roubado o livro de uma garota sem perceber. Ela era a dona do livro. E deve ter ficado estupefata. Um fã do Mia Couto afanou seu exemplar. Não levou o celular, a carteira, só quis o livro. Um danado de um amante da literatura, deve ter pensado ela. Assim são as histórias escritas também pela vida, interpretadas a seu modo por cada um.

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