A última que morre [by Martha Medeiros]

Atualmente recebemos tanta informação para digerir que não sobra espaço na cabeça para questionarmos ditados já consagrados. Então seguimos repetindo, dia após dia, frases que nos parecem definitivas, como “a esperança é a última que morre”, sem se dar conta de que elas não são definitivas coisa nenhuma. Por que manter um estado de ilusão eterno? Em certas circunstâncias, é muito bom perder a esperança.

Esperança não transforma o mundo. Não muda a sua vida. Apenas oferece um breve conforto, faz de conta que as coisas se arranjarão sozinhas através do pensamento positivo. Mas uma coisa é confiar em bons prognósticos, mentalizar situações agradáveis e, outra bem diferente é ficar esperando milagres. Sem querer ofender ninguém: a esperança se tornou obsoleta.


Você tem esperança de quê? De um mundo melhor, de um país mais justo? Ainda? O.k., gostaríamos que as coisas fossem diferentes, mas a diferença só se efetiva por meio de ações e reações. Quando você tem esperança, tudo o que precisa fazer é ficar sentado aguardando. Já quando ela morre, acaba a morosidade. Você vira a página, troca de capítulo, vai batalhar por outra coisa. Alguém que cansou de esperar é sempre mais produtivo.

Ninguém nunca analisa as desistências por um foco salutar. Elas podem ser o combustível para o início de outro projeto, de um desejo novo. Nem tudo nasceu para dar certo. Certas coisas são tortas por natureza, são boas uns 25%, e os outros 75% não têm pai-nosso que dê jeito. Ficar paralisado diante de algo que nunca vai mudar é estratégia de preguiçoso. Diante do que não muda, só há uma coisa a fazer: mudar a si mesmo, sacrificando as suas antigas intenções.

Ter esperança de um mundo melhor é um sentimento megalômano. Desista de pensar no mundo, não seja tão ambicioso. Ele nunca vai ser muito melhor do que é, mas seu prédio pode ser, o seu local de trabalho pode ser, já que microcosmos não funcionam à base de esperança, e sim de realizações.

Não que eu proponha radicalizar. A gente pode ter um pouquinho de esperança, claro, desde que ela tenha um prazo de validade, não se transforme numa acomodação vitalícia. Tenha esperança até a página 15. Se a história não avança, não é preciso morrer decrépito segurando o mesmo livro na mão. Ele vai continuar chato, vai continuar paralisando você.

O desejo é que deve ser o último a morrer. Ele, sim, merece o prestígio que a esperança, essa velha senhora, ainda pensa que tem.

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